quarta-feira, setembro 21, 2005

A espera

Já estava mentalizada... já sabia que a espera seria longa (como sempre); a custo lá me levantei cedo, muito cedo, para estar à porta do Centro de Saúde a tempo de ser um dos 8 felizes contemplados com a consulta do médico de família!

Parece inverosímel o frio que gela os ossos às 6h da matina (os primeiros raios de sol sabem a um chá morno que desliza pela garganta)... ainda mais inacreditável é o facto de às 6h20 já estar uma romaria à porta do Centro que só abre às 8h30 (parece a fila à entrada do Kremlin aos fins- de- semana). Um atraso de 10 a 15 minutos já invalida qualquer hipótese de conseguir uma consulta.

Levava a lição estudada, porque isto de ir ao Centro de Saúde tem muitas manhas! Ficam as dicas para quem desconhece o procedimento: ao chegar abordar todos presentes "Está alguém para a Dra. Maria da Luz? Qual é o seu número? Então eu sou o nº 6." Não se ausentar enquanto não chegar o próximo utente... é uma forma de garantir que ninguém passa à frente! Depois de chegar o nº 7 e de já termos marcado a nossa posição na fila, podemos tomar um café rápido e regressar ao posto. Nunca ousar entrar dentro do carro estacionado em frente, mesmo que estejamos enregelados de frio, com o cabelo ainda molhado do banho e um pinguinho no nariz prestes a adquirir contornos de estalactite... os outros utentes não gostam e comentam entre si que todos devem estar ao relento até ao abrir portas do Centro.

Formam- se grupos de tagarelice... os chamados clientes habituais aproveitam para pôr a conversa em dia. Eu e o meu livro, de pé, encostados à parede fria trocamos impressões... ele conta- me histórias que eu absorvo avidamente enquanto os minutos passam devagar.

Perto das 8h30 junta- se a multidão à porta numa fila desordeira onde os espertalhões tentam passar à frente dos restantes... gera- se a confusão em torno das senhas, empurrões, palavras ao vento, elevam- se as vozes até uma das funcionárias soltar um poderoso "Sccchhhhhiiiuuuu"... os ânimos acalmam- se, confrontam- se os números atribuídos com a ordem de chegada e colocam- se os impostores contra a parede. Nunca pensei que aqueles velhinhos (as) simpáticos (as) tivessem o descaramento de passar à frente recorrendo a ardilosos pretextos... entre os advogados do diabo e os acérrimos defensores da ordem, restabelece- se a disciplina!

Mais umas horas de espera e finalmente a chamada do altifalante ao gabinete... é nestas alturas que dou graças por não me chamar Abundância (como a minha tia)... os olhares curiosos procuram o movimento, levanto- me da cadeira e dirijo- me apressadamente para a porta... convém que seja mesmo com passadas largas e que a consulta seja rápida porque a espera desespera os restantes!

Quinze minutos parece- me bastante razoável tendo em conta que alguns dos motivos que me levaram lá estão relacionados com o bem comum!

Serviço Público de *linhas: nos bancos de sangue podemos deixar o nosso contributo em horários bastante flexíveis, faz- nos bem à saúde e à saúde dos outros, dá- nos vantagens como a isenção de pagamento de alguns exames. Os bancos de medula esperam por nós num processo indolor que pode salvar vidas!

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